terça-feira, 5 de novembro de 2013

Fetiche: final




Tomou-a nos braços. Seu olhar iluminado pelo fogo que a consumia por dentro. Conhecia bem aquele olhar, mas ao contrário do que desejava, ele seria gentil, cuidadoso e com sorte não decepcionaria um ser tão angelical.
Prender os lábios pequenos e macios entre os seus. Sentir as mãos delicadas explorar seu corpo.
Seu corpo correspondia aos toques sensíveis. Tão linda, jovem, delicada e ao seu alcance.
Pararam por um segundo. Não queria ter pressa. Ela o encarou para depois dizer algo que o surpreendeu.

_Não sei se o que direi vai lhe parecer mal ou estranho, mas prezo muito que me ouça e compreenda minha situação.

Tornar-se confidente daquela que a pouco estava em seus braços. Não acreditava que fosse por mal entendidos, afinal Julie já estava a par de suas aflições e sabia exatamente que ele havia perdido a esposa há anos. Mas ouviria a garota, pois mal nisso não haveria de ter.

_Desejo muito o que está prestes a acontecer, mas... procure entender... tenho alguns...
_Alguns...?
_Preciso que faça algo... por mim.
Apoiou o rosto delicado em suas mãos. O que ele não faria por uma criatura tão meiga.
_O que quiser, mon petit... o que quiser...

Era lindo ver aquele sorriso se abrir. Mas a visão que teve em seguida foi fantástica. Julie era dona de um corpo fascinante. Pequeno, mas fascinante. O Dior caído aos seus pés, o brilho em seus olhos, tudo nela o lembrava de seres encantados criados apenas para satisfazer as vontades dos deuses.
Não havia notado ainda, mas a pequena segurava algo atrás de si. Tentou focar o que seria e teve uma bela surpresa quando descobriu. Olhou o objeto e depois os olhos trêmulos do ser a sua frente.
Sabia que sua sobrancelha estava erguida, pois logo ouviu a voz do seu doce anjo, que na verdade era um anjo um tanto estranho agora.

_Albert... eu entendo, se você... se você não quiser... eu entendo...
_Não... quer dizer... eu... se você quiser eu...
_Por favor, não se sinta na obrigação...
Estava sem jeito, precisa confessar. Aquilo era estranho. Julie. Uma garota doce. Delicada. Pedindo para usar uma coleira.
_Eu... eu não me sinto obrigado... a nada... só pensei que...
Os olhos dela se afastaram. Pousaram no chão. Estava se encolhendo. Depois daquilo era difícil acreditar, mas ela parecia envergonhada.
_Julie...
_Não. Não fala nada... Você é bom, Albert. Um homem bom. Preciso te explicar...
_Explicar? Mas do que está falando?... se quer usar isso enquanto...
_Não é isso, Albert... não é apenas isso...
_Então, o que é?! Estou confuso...
_Sente-se...
_Não me mande sentar em minha própria casa.
_Desculpe.

Ela andava e falava de uma maneira que eu não havia reparado antes. O que estava tentando me dizer? Devia dar uma chance? Devia ouvir o que havia de tão terrível para tanto mistério?

_Pois bem... explique-se.

Ela não se virava e iniciou. Contou a história mais esdrúxula que uma ser humano normal poderia escutar. Terminado, ela permaneceu de costas. Não arriscaria dizer algo, pois realmente não entendia muito bem a história e realmente não sabia quem estava mais a minha frente naquele exato instante.

_Por favor, diga alguma coisa... pelo amor de deus, fala alguma coisa!

Não pretendia ser mal educado ou sarcástico, mas meu interior estava implorando por algo rude e grosseiro.

_Dizer o que?! Não sei nem com quem falo agora! Respondo para qual das duas?! Heim?! Julie ou Chloé?!
_Não... você entendeu errado... eu...
_Quer mesmo que eu acredite nisso?! Ou faz parte dessa história maluca que acabou de inventar?! Olha, se você apenas tivesse me dito que gosta de usar seus brinquedinhos e parasse de inventar histórias, mas é impossível acreditar! Você mente!
_Não! É verdade!... Albert. Por favor, olha pra mim... olha...
_Eu não sei se devo, afinal quem eu encontraria ai?! Qual das duas está representando agora?!
_Não estou representando! Não é assim que funciona!
_E era para funcionar?! Você me engana, diz que é uma pessoa, quando na verdade é outra... me diz: Julie é seu nome de verdade? Aquele senhor é seu avô? Você mora mesmo naquela rua?
_Claro que sim... bem... não moro naquela rua, meu avô mora lá, mas o que isso tem a ver...
_O que isso tem a ver?! O que tem a ver?!... você é muito sínica mesmo. Claro... Engane o Albert. Mostre como é superior. Faça-o acreditar na historinha da carochinha e depois... e depois... me diz, o que vem depois? Vai me fazer assinar um cheque? Quer o número da minha conta no exterior? Ou melhor, quer ser minha herdeira... Claro! Por que assim receberia em dobro, não é?!... Não, na verdade não me diz o que vem depois... estou muito nervoso. É, nervoso. Irado. Com muita raiva. Tenho vontade de te esmagar, mas não faria isso... ao contrário eu te torturaria se fosse possível, mas você deve ser a maior tortura para si mesma!
_Por favor, para! Para! Eu não quero ouvir! Você é cruel! É mau! Egoísta! Acabo de te contar uma parte de mim e olha o que me faz! Acabo de te falar que possuo problemas, que penso ter dupla personalidade e olha o que me fala! Qual é o seu problema?! Você acha que pode fazer tudo só porque é rico?! Ou é retardado mesmo?!
_Abaixe a voz para falar comigo, garota!- minha voz já estava saindo entre os dentes. Não queria mais ouvir. Foi quando vi. Ela estava abaixada e nessa posição colocou aquela coisa no pescoço.
Virou-se. Definitivamente já não era mais a mesma. Havia mudado. Os olhos enegreceram, a expressão tornou-se lasciva e estava se aproximando de forma perigosa. Tentou tocar-me, mas desviei.
_Oh. Albert... eu sei o que você quer... venha, Albert. Venha...

Desviar do seu caminho era difícil. A voz era outra e eu já estava contra a parede. A consciência pesou. Queria realmente ter aquele corpo, mas não seria ela. Ou seria?
Encurralado. Os dedos tocaram meu corpo. Eram tão quentes. Ela era quente. Encostou os lábios em meu pescoço e iniciou pequenos chupões na área. Estava delirando. Não podia. Não era sensato. Prendi seus pulsos e a pressionei contra a parede. Oh, o que estava fazendo?
Continuava a me encarar daquele modo. Perdi a razão. Suguei os lábios. Eram bons, mas não os mesmos. Tudo era diferente, até o cheiro. 

_Julie eu...
Pousou os dedos na minha boca. Soube que não era mais Julie. Eu a havia perdido. Aquela era Chloé. E sabia me tentar passando sua perna entre as minhas. Tomei-a. Agarrei seus cabelos e comecei a marcá-la. Apesar da força e do ódio que eu ainda sentia, ela não parecia ter raiva. Ao contrario eu poderia dizer que o que via era prazer. Puro e simples prazer.
Prazer esse que apenas aumentou quando já estávamos unidos. Aumentava o ritmo e me satisfazia ouvindo os sussurros e gemidos. Mordia cada centímetro daquele corpo. Eu a faria minha, minha e de mais ninguém. Seus olhos reviraram ao chegar no ápice. Senti-me completamente preso dentro dela. Estávamos ofegantes. Finalmente havia terminado.


***
Observava o mar, quando sentiu mãos que se entrelaçavam em sua cintura. Foi virada de frente e agarrada pelos cabelos. Cabelos que agora já eram definitivamente curtos e escuros. A boca foi sugada como apenas ele sabia fazer. Parou para tomar fôlego, mas decidiu não continuar.

_Pensei que não viesse.
Aquele sorriso. Lindo como sempre.
_Bobinha... é claro que viria... afinal, após a audácia de uma certa femme fatale em se revelar aquela noite, eu não poderia recusar.
Era isso o que ela queria ouvir. Agarrou seus cabelos e o encarou.
_Agora estamos a sós... eles se foram... completamente... Julie e Albert já não existem mais.
_Eu gostaria que não me chamasse mais assim.
_E como gostaria de ser chamado, nobre senhor?
_Acho que aquele modo como me chamou a meses atrás seria suficiente.
Sorriu com a malícia dele.
_Deus? Semi deus?
Percebeu os lábios de prontidão para darem uma afirmativa, mas antes que ele o fizesse, ela selou suas bocas. E agora poderiam realmente viver, sem interrupções.

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